9 de outubro de 2018

O CredoBatismo Kalleyano e Cristão Evangélico


Introdução:

“Eu não sou presbiteriano” e “eu não sou batista”. Em dois momentos diferentes o Rev. Robert Reid Kalley sentiu a necessidade de se posicionar e demonstrar que entre grandes movimentos denominacionais é possível uma terceira via, autóctone e fiel ao Senhor Jesus. No Brasil há uma polarização na questão da doutrina do batismo, dois extremos se chocam e alguns postulados são criados. Por exemplo, quando a doutrina do batismo está unida ao conceito de aliança ou pacto, ela passa a ser considerada por alguns uma teologia presbiteriana. Os batistas reformados e os kalleyanos são praticamente esquecidos; aqui se inclui a Igreja Cristã Evangélica do Brasil (ICEB), uma denominação teologicamente kalleyana e que também é devedora em suas origens ao trabalho dos Kalleys e sua influência nos missionários pioneiros da UESA.[1] Por isso, desejo como Ministro Cristão Evangélico e defensor da posição kalleyana refletir e trazer à tona algumas ideias do credobatismo (batismo de crentes) e a inclusão dos filhos na aliança fora do eixo batista/presbiteriano. O documento teológico mais importante na história da Igreja Cristã Evangélica, o Catecúmenos diz o seguinte sobre o batismo: “No batismo a pessoa declara e aceita os termos do pacto com Deus, e assegura ao cristão a salvação eterna”.[2]

Essa posição doutrinária da ICEB é fruto da teologia kalleyana e exposta na Breve Exposição das Doutrinas Fundamentais do Cristianismo: “25º) Do batismo com água – O batismo com água foi ordenado por Nosso Senhor Jesus Cristo como figura do batismo verdadeiro e eficaz, feito pelo Salvador quando envia o Espírito Santo para regenerar o pecador. Pela recepção do batismo com água, a pessoa declara que aceita os termos do pacto em que Deus assegura aos crentes as bênçãos da salvação”.[3]

Talvez a doutrina menos kalleyana na ICEB seja a forma de governo, pois os missionários pioneiros e obreiros brasileiros, como os Revs. Acácio Gedeão Coutinho e Eliel de Almeida Martins, decidiram por um governo menos congregacional e mais democrático representativo. Esse modelo é chamado pelo Rev. João Batista Cavalcante, atual presidente da ICEB de “Presbiterial”.[4]Note que não é presbiteriano.

O objetivo teológico desse artigo é responder com simplicidade e muito respeito a duas posições bem fortes e presentes entre evangélicos brasileiros. A primeira é a posição pedobatista (batismo de recém-nascidos). O Rev. Robert Palmer, na palestra 1, proferida no JMC (Seminário José Manoel da Conceição), pergunta: “é possível alguém ser um teólogo que crê no pacto e não acreditar no batismo de crianças?” Ele mesmo responde: “se você quer ser realmente um teólogo da aliança com todas as letras você vai acabar tendo que de fato crer no batismo infantil”.[5]

Parece que tem se tornado comum a afirmação acima. É incrível o número de pessoas que rotulam os outros de “presbiterianos”, somente pelo fato de crerem plenamente no ensino bíblico da aliança. Por isso, as premissas expostas nesse artigo serão duas: “que os filhos menores são biblicamente herdeiros da aliança e que o batismo deve ser administrado a partir de uma idade de discernimento”. Nessa questão, esse autor se coloca distante do pedobatismo e mais distante ainda de qualquer doutrina que exclui os filhos menores e que mande os filhos menores de crentes para o inferno e os exclui da comunhão da igreja local.

A segunda é a posição credobatista batista. A diferença com os batistas não está na questão da aliança porque os batistas particulares[6] também consideram a teologia bíblica da aliança, mas difere no conceito de inclusão dos filhos menores nessa aliança. Para os batistas via de regra somente entra na aliança aquele que tem fé, por isso “todos os batistas particulares eram ou são pedouniversalistas” (como Charles Spurgeon e John Piper). Porém, já li e ouvi irmãos de outras correntes batistas que excluem seus filhos menores, entregando-os ao mundo e considerando que se um filho pequeno falecer estará destinado ao inferno. Um desses teólogos é o Errol Hulse:

Nossa resposta a possível pergunta dos nossos filhos, por conseguinte, deve ser: Filho, tu tens tido o maior privilégio que existe no mundo, isto é, crescer debaixo do ensinamento e luz do Evangelho, debaixo da educação e admoestação do Senhor. Este privilégio e vantagem tem sido negado a uma vasta proporção da humanidade. Tampouco dê evidência de que estás unido ao Senhor Jesus por fé e de que se arrependeu dos pecados, então procederemos a pedir o batismo. Porém não podes, debaixo do Novo Testamento basear-se somente na fé de teus pais... A ordem correta para essas coisas se expõe em Atos 2.41-42. A confusão surge quando abandonamos a simplicidade do Novo Testamento em que o batismo simboliza nossa união com Cristo e com a igreja local que se compara com o corpo de Cristo.[7]

A fim de negar o batismo ao filho, ele acaba por excluir o filho de qualquer comunhão ou participação espiritual em Cristo e em sua Igreja. Eu concordo sobre a aplicação do batismo, mas eu perguntaria ao Errol Hulse e na verdade ele responde isso em seu livro: Enquanto seu filho não tem fé pessoal em Cristo, ele pertence a quem? Você sugere que pertence ao mundo ou a outra coisa qualquer. Nessa questão a palavra do teólogo Chapell é muito relevante, exceto na aplicação do batismo:

Não existe razão para presumir que, porque as crianças não são capazes de expressar fé madura, elas devam ser tratadas como descrentes. Não há hipocrisia em levá-las à igreja, encorajá-las a expressar alegria por Cristo, amá-las, ou permitir que orem antes de dormir, ou manifestem outras expressões de fé infantil. Pelo contrário, seria antibíblico tratar nossos filhos como descendência de Satanás, não amados por Deus, e inimigos da família da fé, até eles expressarem fé salvadora.[8]

Por essas duas razões, proponho uma breve resposta e uma terceira via, que na verdade já existe. Somente pretendo trazer a lume que é a posição credobatista kalleyana:

1. O credobatismo kalleyano se fundamenta na doutrina bíblica da aliança.

No questionário doutrinário elaborado pelo Rev. Robert Reid Kalley com o propósito de receber novos membros, ele pergunta: “10º) Quereis ser batizados, para significar que concordais com a aliança, pela qual Deus assegura ao crente o pleno proveito do sacrifício expiatório de Jesus, e que, portanto, decidis, com o auxílio divino, serví-lo sempre durante o resto de vossa vida aqui na terra?”[9]

O Deus Triúno, conforme revelado nas Escrituras é um Deus de aliança. Além de estabelecer uma aliança com seu povo, Ele leva a aliança muitíssimo a sério e nunca a quebra ou desfaz: “Eu disse: nunca invalidarei a minha aliança convosco” (Jz 2:1).
Como parte do eterno decreto, Deus soberanamente estabeleceu duas alianças. A primeira aliança foi com Adão e a criação. Há dois textos bíblicos que revelam uma aliança da criação: “Mas eles, como Adão, transgrediram a aliança na terra que lhes concedi...” (Os 6:7 - BH) e “Assim diz o Senhor: Se a minha aliança com o dia e com a noite não permanecer, e eu não mantiver as leis fixas dos céus e da terra” (Jr 33:25).

No caso de Adão, mesmo o texto bíblico sendo claro, alguns rejeitam a aliança porque não houve o uso da palavra berith, porém podemos facilmente deduzir a aliança, pois o uso da palavra berith em todos os outros casos na Bíblia se refere a um contrato/acordo, contendo: afinidade, compromissos, leis, sentenças de cumprimento, promessas condicionais e incondicionais e punições no caso de infidelidade. Assim sendo, em Gênesis Deus está em aliança com a criação e Adão.

Essa primeira aliança foi quebrada e o Senhor trouxe punição. A punição se espalhou através dos filhos de Adão; ou seja, Deus imputou aos filhos o pecado. Por que? Os filhos estão claramente envolvidos nessa aliança adâmica, fazem parte do mandato e por ele seriam abençoados. Na história bíblica, os filhos serão abençoados pela obediência dos pais ou amaldiçoados pela infidelidade dos pais. Na cultura bíblica há um federalismo, corporativismo ou coletivismo e não individualismo (Êx 20:5-6).

A infidelidade na aliança trouxe consequências devastadoras e uma punição global. Mas, como Deus não quebra a aliança da criação, Ele escolhe Noé, o único que obedece aos termos de fidelidade e resolve renovar a aliança da criação. Após a ira de Deus ser derramada, Ele renova a aliança em Noé, para preservar sua criação e continuar com seu plano eterno de redimir sua criação. A Bíblia diz: “contigo, porém, estabelecerei a minha aliança; entrarás na arca, tu e teus filhos, e tua mulher, e as mulheres de teus filhos” (Gn 6:18).

Como visto, esse é o primeiro versículo na Bíblia que aparece a palavra “aliança” (berith). Curiosamente ele vem acompanhado do verbo traduzido como "estabelecerei", no hebraico קום (qûm). O verbo é um Hiphil, introduzindo uma ideia causativa, assim seu significado passa a ser “colocar de pé”, o que pode ser também “estabelecer” (colocar algo de pé) e “ratificar”. Deus é o sujeito que está “mantendo de pé”, “confirmando” a aliança com Noé, aliança essa que já havia sido feita com Adão”.[10]Percebe-se que em todos os textos bíblicos os filhos estão incluídos na aliança através da fé dos pais.

A segunda aliança é a aliança eterna (Hb 13:20), chamada também de aliança da graça. Essa aliança foi estabelecida debaixo de uma promessa de redenção (Gn 3:15). Após a queda da primeira aliança e a entrada do pecado no mundo, Deus revelou seu eterno decreto da redenção. Na história bíblica podemos deduzir ou perceber a ordem dos decretos de Deus: o decreto da criação, decreto da permissão da queda e o decreto da redenção. A promessa foi feita – “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirá o calcanhar”. A promessa está feita e repousa sobre a graça. Já é possível perceber traços da graça de Deus em Noé. Em Hebreus 11:7, o Novo Testamento revela que “a graça de Deus opera a salvação de Noé e seus filhos por meio da justiça que vem da fé”; esse é o conceito de salvação pela graça mediante a fé. Por isso, podemos observar claramente aqui a aliança da graça, que sempre supera nos eleitos a condenação de morte prescrita na aliança da criação.

Vê-se a continuidade da aliança da criação e a manifestação da graça, pois Deus salva Noé e seus filhos (Gn 6:8-22, 9-16). Agora, como parte da aliança da criação Deus promete não destruir mais o planeta, porém ainda pune sua criação pela infidelidade, com dores e adversidades (Rm 8:18-22). Isso também demonstra que a aliança da criação permanece em vigor, aguardando a redenção e sofrendo. Outro texto bem claro sobre a salvação pela graça em Noé está em 1Pedro 3: 18-22, onde o Espírito revela que Jesus estava pregando e batizando através de Noé e isso com o evangelho da redenção (v. 21).

Essa aliança da graça continua, mas agora é mais claramente exposta em Abraão. Deus chamou Abraão para uma aliança: “Naquele mesmo dia, fez o SENHOR aliança com Abrão, dizendo: À tua descendência dei esta terra, desde o rio do Egito até ao grande rio Eufrates...”(Gn 15: 18). No capítulo 17 de Gênesis há o uso da palavra aliança 12 vezes. Essa aliança é estabelecida perpetuamente e inclui seus filhos: “No mesmo capítulo Deus reafirma a promessa de um filho e diz: “...lhe chamarás Isaque; estabelecerei (קום qûm) com ele a minha aliança” (Gn 17:19; ver v. 21). Ora, Deus estava dizendo que estabeleceria uma aliança com Abraão (v. 7) e logo em seguida ele diz que estabeleceria outra nova aliança com Isaque (v. 19)? Não! É óbvio que ele está falando da mesma aliança! A ideia é que ele ratificaria, confirmaria, manteria de pé a aliança com Abraão e continuaria a confirmá-la com Isaque”.[11]

Como a aliança da graça foi revelada em Abraão e perpetuamente, até o final da história Deus guarda, preserva e governa essa aliança por meio de Testamentos. Há dois Testamentos na aliança da graça. O Antigo Testamento “foi administrado por meio de promessas, profecias, sacrifícios, circuncisão, cordeiro pascoal e de outros tipos e sombras”[12] que prefiguravam o Cristo que haveria de vir. O Novo Testamento é o mesmo em substância e essência, mas administrado “pela pregação da Palavra, sacramentos do batismo e ceia” e com uma abrangência maior; ou seja, a inclusão espiritual dos gentios e a plenitude da lei em Cristo. A ideia dessa explicação está em Hebreus 9:15-22.

O Apóstolo nos esclarece em Gálatas, reafirmando a aliança da graça feita com Abraão e ratificada ou cumprida em Cristo: “Sabei, pois, que os da fé é que são filhos de Abraão. Ora, tendo a Escritura previsto que Deus justificaria pela fé os gentios, preanunciou o evangelho a Abraão: Em ti, serão abençoados todos os povos. De modo que os da fé são abençoados com o crente Abraão” (Gl 3:7-9). “Pois todos vós sois filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus; porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes. Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus. E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa” (Gl 3: 26-29).

2. Os Filhos da Aliança.

Já foi explicado a inclusão dos filhos na aliança dos pais em Adão, Noé e Abraão. Agora veremos mais claramente a inclusão na aliança da graça, sob a administração do Antigo e Novo Testamentos.

a) No Antigo Testamento

Vê-se que a promessa de Deus sempre inclui os filhos menores. Depois de 430 anos de escravidão no Egito, “Deus lembrou-se da sua aliança com Abraão, com Isaque e com Jacó” (Êx 2: 24). Na libertação, Faraó não queria deixar ir os filhos menores (Êx 10: 10), então Moisés replicou: “Havemos de ir com os nossos jovens, e com os nossos velhos, e com os filhos, e com as filhas, e com os nossos rebanhos, e com os nossos gados; havemos de ir, porque temos de celebrar festa ao Senhor” (v.9). Os filhos sempre estarão juntos dos pais.

Assim como aconteceu com Noé, Deus estabelece o juízo sobre o Egito (Êx 12: 29-30). Pelo elemento sacramental da páscoa (sangue), que simboliza a aliança os “primogênitos dos israelitas” foram salvos (Hb 11: 28). Daí, a páscoa e a ceia passaram a ser os sacramentos e as ordenanças da aliança e libertação de Deus, representados pelo cordeiro pascal e seu sangue derramado (Êx 12: 26, 43; Mt 26: 18-30; 1Cor 5: 7, 11: 20-34). Destaco aqui o fato de que quando Deus se lembra da aliança e resolve tirar os israelitas, na punição Ele salva os filhos da aliança e pune somente os filhos dos incrédulos. A citação de Hebreus é proposital para demonstrar que a fé alcança somente os filhos dos israelitas e não todas as crianças.

Ainda nesse contexto da antiga aliança, gostaria também de expor Êxodo 20 e Deuteronômio 5. Nesse texto o povo da aliança recebe as tábuas do Testemunho (Êx 31: 18), tábuas que regerão a aliança entre Deus e o povo (Êx 31:12-18) e que foi escrita “pelo dedo de Deus” duas vezes. O texto expõe claramente que Deus pune com maldição visitando “a iniquidade dos pais nos filhos” (Êx 20:5). “O segundo mandamento prevê a visitação do juízo divino sobre os descendentes de pais ímpios, descendentes estes que aborrecem a Deus com seus pais”.[13] A Bíblia diz que no caso dos filhos dos crentes não há maldição, mas sim misericórdia. “No hebraico, hesed é uma palavra característica da aliança”.[14] A misericórdia (hesed) está somente sobre os filhos da aliança (Sl 103: 17-18; 115:14).

Em Ezequiel os filhos dos crentes pertencem ao Senhor. Em Ezequiel 16:21, Deus censura o povo por dar as suas crianças ao sacrifício pagão, fazendo-lhes passar pelo fogo, e Ele diz em referência a estes pequeninos: "E mataste a meus filhos, e os entregaste a elas para os fazerem passar pelo fogo." Então, esses filhos menores, que morreram nos braços ardentes do fogo pagão como criancinhas, eram filhos de Deus. Também é dito no capítulo 18: “Eis que todas as almas são minhas; como a alma do pai, também a alma do filho é minha...”.

Nessa questão concordo com João Calvino quando diz: “Por isso, os filhos dos judeus, sendo também feitos herdeiros desse pacto, uma vez que se distinguiam dos filhos dos ímpios, eram chamados semente santa (Es 9: 2; Is 6: 13); pela mesma razão, ainda agora, os filhos dos cristãos são considerados santos, ainda que nascidos só de um genitor fiel; e, segundo o testemunho do Apóstolo (1Co 1: 14), eles diferem da semente imunda dos idólatras” (Institutas, IV, 16, 6).

b) No Novo Testamento

O Novo Testamento é a continuidade do plano eterno de Deus, tanto na redenção mediada por Cristo, bem como na aliança e promessa com Abraão. Essa aliança claramente definida em Abraão é executada de forma progressiva até sua revelação plena e conclusiva na nova aliança. A nova aliança é uma renovação da antiga e está dentro dela (Jr 31), porém há mudanças em sua natureza e também certa descontinuidade, principalmente naquilo que se referi aos sinais e sua administração. Porém, como não há mudança na substância, conclui-se a permanência dos filhos como receptores das promessas e punições aos pais.

Mateus 19: 14-15. “Trouxeram-lhe, então, algumas crianças, para que lhes impusesse as mãos e orasse; mas os discípulos os repreendiam. Jesus, porém, disse: Deixai os pequeninos, não os embaraceis de vir a mim, porque dos tais é o reino dos céus. E, tendo-lhes imposto as mãos, retirou-se dali”.

Os fariseus estão experimentando Jesus em relação ao divórcio. Após Jesus reinterpretar Deuteronômio 24:1 e estabelecer a correta interpretação do casamento e divórcio, lhe trouxeram suas crianças. A postura de Jesus é receptiva e inclusiva, dizendo: “...porque dos tais é o reino dos céus”. Jesus está tratando da lei do casamento e ele não poderia descartar a lei logo em seguida, então é sabido que pela prescrição Deus “visita a iniquidade dos pais nos filhos” (Êx 20), sendo assim nesse texto Jesus está falando sobre os filhos dos crentes (fariseus) e a eles a benção do Reino é destinada e não a todas as crianças.

Outro detalhe importante é que a expressão grega é: Ἄφετε τὰ παιδία  (deixai vir a mim os pequeninos) – essa expressão no grego significa: “criancinhas de peito”, ou seja, uma referência direta que o Reino e a benção de Jesus se destina aos filhos “menores” dos crentes. Esse texto corrobora com a ideia que vem a seguir, a idade de discernimento no item 3.

Atos 2:39. “Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor, nosso Deus, chamar”. Essa promessa do dom do Espírito é aplicada aos crentes, aos seus filhos e àqueles que pela eleição serão incluídos na aliança. A construção do grego nos auxilia aqui: ὑμῖν γάρ ἐστιν ἡ ἐπαγγελία καὶ τοῖς τέκνοις ὑμῶν καὶ πᾶσιν τοῖς εἰς μακρὰν, ὅσους ἂν προσκαλέσηται Κύριος ὁ Θεὸς ἡμῶν. Em negrito temos literalmente – “e para os filhos vossos”. A Bíblia inclui os filhos na promessa dos pais e também abre uma terceira opção, ou seja, τοῖς εἰς μακρὰν (os de longe), àqueles que não são filhos da aliança (naturalmente), mas Deus chama pela eleição soberana. Deus tem salvado crianças em nossas igrejas, filhos de não crentes. Bendito seja seu Nome!

O mesmo apóstolo Pedro faz um segundo discurso, demonstrando que essa promessa se cumpriu porque eles são filhos da aliança. Atos 3:25. “Vós sois os filhos dos profetas e da aliança que Deus estabeleceu com vossos pais, dizendo a Abraão: Na tua descendência, serão abençoadas todas as nações da terra”. É óbvio que a promessa é aplicada e sustentada desde o pequeno Isaque até sobre os filhos da aliança no futuro. Os não reformados tentam desassociar nossa relação com Abraão para excluir os filhos da aliança, porém a Bíblia é muito clara e ainda diz: “vocês são filhos da promessa, como Isaque” (Gl 4:28). Segundo a Bíblia assim como Isaque era filho da aliança naturalmente, em sangue; nós pela fé em Cristo Jesus também fomos incluídos nessa herança e não há nenhuma razão bíblica para excluir nossos filhos menores.

Todas as crianças estão em Adão e a última instância é a eleição. Por isso, concluo que os filhos da aliança de alguma maneira se morrerem antes da idade de discernimento serão regenerados pelo Espírito à semelhança de João Batista. A Bíblia ensina que é preciso ser regenerado para entrar no reino dos céus (Jo 3) e Jesus entrega o Reino às crianças (Mt 19:14). Porém, todos os outros permanecerão filhos de Adão e receberão a paga pelos seus próprios pecados, exceto se foram eleitos pela soberana graça.

É oportuna a resposta que Calvino oferece àqueles que excluem os filhos, difiro somente na aplicação do batismo, porém endosso na inclusão e salvação dos filhos menores:

E assim concluem que elas não devem ser tidas em outra posição senão a de filhos de Adão, até que hajam amadurecido a uma idade congruente com o segundo nascimento. Mas tudo isso se opõe frontalmente à verdade de Deus. Pois se devem ser considerados filhos de Adão, então são abandonados à morte, em Adão, e por isso nada podemos fazer senão morrer (Rm 5:12-21). Cristo, porém, em contrário, manda que elas sejam trazidas a si (Mt 19:14; Mc 10:14; Lc 18:16). Por quê? Porque ele é a vida. Portanto, para que lhes dê vida, ele as faz participantes de sua pessoa; enquanto, entrementes, esses tais as condenam a que sejam afastadas para longe, trementes, permaneçam na morte. Porque, se tergiversam que as crianças não perecem por serem reputadas filhas de Adão, seu erro é mais do que suficientemente refutado pelo testemunho da Escritura. Ora, uma vez que a Escritura sentencia que em Adão todos morreram, segue-se não restar nenhuma esperança de vida, a não ser em Cristo (1Co 15:22). Portanto, para que nos tornemos herdeiros da vida, é imprescindível que tenhamos participação nele (Institutas, IV, cap. 16, 17).

Outro texto importante no Novo Testamento está em 1Coríntios 7:14: “Porque o marido incrédulo é santificado no convívio da esposa, e a esposa incrédula é santificada no convívio do marido crente. Doutra sorte, os vossos filhos seriam impuros; porém, agora, são santos”.

A palavra para impuro aqui é ἀκάθαρτά (akatharta), uma palavra normalmente usada para os “espíritos imundos” (Mc 3:11,5:13; At 8:7; Ap 16:13) ou no sentido sexual, de prostituição/imoralidade. É uma palavra aplicada aos não cristãos. Por isso, o Apóstolo afasta o filho do crente dessa condição, não associando a criança com os incrédulos ou demônios. A palavra corretamente atribuída ao filho do crente é ἁγία (hagia), uma palavra com 14 ocorrências no Novo Testamento e todas atribuídas aos crentes ou algo consagrado a Deus, como em Rm 7:12: “...a lei é santa” e em 1Cor 7:34, no mesmo capítulo onde o Apóstolo chama a viúva e a virgem que servem ao Senhor de “santa”.

Daí concluo com alguns excelentes comentários sobre esse texto: “Quanto ao fato do Apóstolo aqui atribuir privilégio especial aos filhos dos crentes, isso emana da benção do concerto, por cuja intervenção a maldição da natureza é destruída e, por isso os que por natureza eram impuros, agora são consagrados a Deus em decorrência de sua graça”.[15]“Paulo parece se ater às convicções e ao costume dos judeus, os quais consideram que os filhos participam da aliança. Enquanto não tiver idade bastante para tomar sobre si a responsabilidade, o filho de um pai crente deve ser considerado cristão. A santidade do pai ou da mãe abrange a criança”.[16]O interessante segundo Leon Morris é que a palavra santo ou puro usada aqui remete ao início da carta onde o Apóstolo chama a ekklesia de “santificados em Cristo” e “chamados para ser santos”. Aqui em 7:14, ele inclui a criança na ekklesia como um dos santos.[17]

Por essa razão, na tradição da Igreja Cristã Evangélica se inclui os filhos menores na comunhão da igreja local. “Todas as pessoas professas e batizadas e os menores consagrados constituem a Igreja de Deus e a ela pertencem”.[18]

3. A idade de discernimento
“... Estou bastante satisfeito que crianças sejam batizadas, mas apenas as crianças que professam solenemente a Cristo e vivem vidas de acordo com o evangelho” (Rev. Robert Kalley).[19]

Gostaria de explicar que a Bíblia revela que sobre esses filhos pesa a “idade de discernimento”. Em Deuteronômio 21:18-21, nós temos uma clara descrição de que Deus atua no filho menor considerando a idade de discernimento. O filho “contumaz e rebelde” não ouve a voz de seus pais; a ideia é de “não lhes dá ouvidos”, ou seja, após várias repreensões e castigos ele continua impenitente. Por essa causa, os pais deveriam levá-lo para um julgamento público. Percebe-se aqui que esse filho está em idade apropriada para esse processo. Antes desse momento cabia aos pais à disciplina e correção, mas em determinado momento essa responsabilidade passa às autoridades constituídas.

Em Efésios 6: 1-4, percebe-se que os filhos menores deveriam ser criados na “disciplina e admoestação do Senhor”. Os filhos devem “obedecer aos pais no Senhor”. A Bíblia traz à tona o quinto mandamento, sob o qual os filhos dos crentes estão jurisdicionados. Toda a responsabilidade sobre o filho é colocada nos pais e não há como negar que a expressão “no Senhor” se remete à vida cristã. O mandamento não é dado aos não crentes como obrigação e eles não andam “no Senhor”, são incrédulos. Assim podemos afirmar que no processo de criação (filhos menores) Deus cobra toda a responsabilidade da vida espiritual dos filhos pequenos dos seus pais; a jurisdição da lei está sobre os pais (Dt 6: 6-7; Pv 22: 6).

Em Ezequiel 18, Deus diz: “Eis que todas as almas são minhas; como a alma do pai, também a alma do filho é minha; a alma que pecar essa morrerá”. No contexto do capítulo 18 veremos que os filhos da aliança quando cresciam deveriam permanecer na aliança (alguns não guardaram) ou se fosse filho de um pecador impenitente se converter para não receber a maldição hereditária (Ez 18:4-20; 2Cor 5:17). Aliás, a Bíblia ensina que a própria eleição para a salvação precisa ser confirmada após a vida adulta (2Cor 13:5; 2Pe 1:10). O filho da aliança quando alcança determinada idade está qualificado para um auto-exame espiritual e assim possui condições intelectivas e emocionais de discernir sua eleição em Cristo. Por essa razão, Deus em sua misericórdia alcança o filho menor pela fé dos pais e pune os maiores por meio de sua própria condição espiritual.

Se é necessário que a eleição seja confirmada e na idade de discernimento e a criança precisa expressar fé, se torna necessário que o filho da aliança seja evangelizado e levado a Cristo e ainda, a impossibilidade em reconhecer a idade de discernimento exige que os pais levem a sério sua obrigação de inculcar o evangelho na cabeça do filho menor. “Quereis ser batizados, para significar que concordais com a Aliança, pela qual Deus assegura o crente o pleno proveito do sacrifício expiatório de Jesus, e que, portanto, decidis, com o auxílio divino, serví-lo sempre durante o resto de vossa vida aqui na terra?”[20]Se o batismo é concordância com a aliança, pode-se afirmar que em algum momento essa criança menor passa a compreender e concordar ou discordar.

4. O batismo como um sinal sacramental

a) A importância de um sinal externo. Eu concordo plenamente com meus irmãos pedobatistas no sentido espiritual do batismo. Há uma necessidade bem exposta na Bíblia de um sinal externo; toda vez que Deus faz uma aliança é exigido um sinal externo e esse sinal sacramental e de ordenança revela publicamente o relacionamento entre Deus e seu povo. A diferença no credobatismo kalleyano é que o emblema externo da nova aliança exige a profissão de fé e o discernimento para uma boa consciência:

O batismo com água não é essencial para a salvação; sua aplicação externa é um mero testemunho público, diante de testemunhas, de que se aprova uma aliança (ordenança) que tipifica a purificação, o refrigério, o conforto e o poder do Espírito Santo.[21]

Desde os dias da criação que Deus administra seu relacionamento de aliança por meio de sinais externos. Deus plantou um jardim no Éden e levou o homem até lá, daí fez brotar o necessário para o alimento. Porém, “nem só de pão viverá o homem”, por isso também fez brotar a árvore da vida e a árvore do conhecimento do bem e do mal”. Essas duas árvores são sinais externos da vida eterna e da obediência que Deus requereu do homem (Gn 2: 7-9).

Depois em Noé, Deus deixou outro sinal da aliança, dizendo: “será por sinal da aliança entre mim e a terra” (Gn 9: 13). Além dos sinais da aliança da criação, Deus formou um povo e fez uma aliança contendo sinais externos: “Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado”(Gn 17: 10) e acrescentou posteriormente por ocasião da libertação a páscoa, dizendo: “o sangue vos será por sinal nas casas...”. Deus os libertou por causa da aliança (Êx 2: 24) e por estatuto perpétuo incluiu como um segundo sinal em seu relacionamento com seu povo (Êx 12: 14).

Na nova aliança esses sinais são mantidos em significados e mudados e aperfeiçoados em Cristo. Aquilo que era tido como sombra se tornou realidade em Cristo (Cl 2: 17; Hb 8). A páscoa passa a ser a ceia do Senhor (Mt 26: 17-30) e a circuncisão passa a ser o batismo (Cl 2:11-12), para nossos propósitos focaremos no batismo apenas e esse como um sinal externo da aliança iniciada em Abraão e concluída em Cristo. Kalley afirma: “...assim o batismo dos crentes é um selo do contrato em que Deus lhe assegura, de graça, perdão e vida eterna...”.[22]O selo é um sinal externo que revela uma obra no coração. Como dizia o Rev. Eliel de Almeida Martins: “Batismo é o selo da fé”.[23]

Kalley não aceitava o batismo infantil. Quando enviou um missionário batista ao Brasil, chamado William Bowers; justificando a sua aceitação já que Kalley não era batista e não tinha vínculo denominacional deu ênfase a duas questões: primeiro o fato de que Bowers não considerava essencial o batismo por imersão e segundo “que ele se opõe ao batismo de crianças”.[24]

b) O sinal externo é substituído. Na aplicação desse sinal os credobatistas kalleyanos diferem dos seus irmãos pedobatistas. Para o pedobatismo o sinal externo é recebido por hereditariedade: “O batismo infantil fala de um relacionamento hereditário com Deus, que nos vem por descendência”.[25]O Novo Testamento revela uma clara mudança na aplicação e administração desse sacramento, excluindo a hereditariedade desse sinal externo. O comentário do Watson é muito apropriado nessa questão:

Entre as multidões que vinham ao batismo de João, havia muitos dos fariseus e saduceus aos quais João advertia: “Não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão” (Mt 3: 9). Era como se ele estivesse anunciando: Vocês podem ser filhos da aliança feita com Abraão e, portanto, têm direito de celebrar a páscoa e receber a circuncisão, independente do caráter moral de vocês, mas não pensem que a hereditariedade os qualifica para o meu batismo. Meu batismo é de arrependimento. Por isso, produzi frutos dignos de arrependimento.[26]

Percebe-se claramente que o sinal externo é mudado, mas o significado de inclusão permanece e há de fato a necessidade de considerar a fé daquele que recebe esse sinal, diferentemente da aplicação do sinal na antiga aliança. Citei o T.E Watson aqui porque nessa questão ambas as igrejas, Congregacional e Cristã Evangélica, podem se identificar com as Igrejas Batistas, como percebe-se no movimento kalleyano:

A Igreja Evangélica Pernambucana não pertence a nenhuma denominação estrangeira; não é presbiteriana, porque esta considera válido batismo romano e pratica o batismo de crianças; aproxima-se mais da denominação batista, mas prefere ter a liberdade de admitir à comunhão  a qualquer crente fiel e obediente ao Senhor… É, pois, uma igreja evangélica brasileira".[27]

Outro texto importante para ser analisado é Colossenses 2:11-12 – Nesse texto vê-se que há uma mudança progressiva na administração do sinal externo. A Bíblia substitui a circuncisão da carne pela circuncisão do coração apenas. O Apóstolo afirma que Nele fomos circuncidados, daí é aplicada essa circuncisão ao batismo, ou seja, nosso batismo cristão é uma circuncisão espiritual, representando nossa união com Cristo, o mediador da nova aliança. Outro detalhe aqui é que essa circuncisão espiritual é ativa, pois estamos Nele “mediante a fé no poder de Deus”. Na antiga circuncisão o receptor era passivo, na nova circuncisão o receptor é ativo e precisa ter fé.

c) Elementos contínuos e descontínuos. O sinal externo da aliança com Abraão é continuado, pois o batismo pela fé na ressurreição é chamado de circuncisão do coração. A aliança é a mesma, porém agora eterna e definitiva em Cristo (Hb 13:20). Mas, a aplicação da carne e somente no macho é descontínua e agora “todos”, homem e mulher entre todas as nações podem ser circuncidados pela fé, recebendo como sinal externo a água do batismo e não mais o corte do prepúcio. A criança era trazida e recebia passivamente. A descontinuidade está no fato de que agora é necessária a própria pessoa buscar o batismo, após se arrepender e também foi acrescentado a necessidade do receptor estar consciente do ato sagrado (1Pe 3:21).

O Rev. Robert Kalley explica muito bem essa certa descontinuidade para o batismo:

Quanto ao batismo de crianças, a Bíblia guarda silêncio e respeito. A circuncisão era um rito, limitado aos machos, no oitavo dia do nascimento, e era aplicado pelo pai, pela parteira, ou por qualquer outra pessoa habilitada. Assim Abraão aplicou-a em Isaque (Gênesis 21:3-4); a mulher de Moisés, Séfora, em seu filho (Êxodo 4:25); Paulo, em Timóteo (Atos 16:1-3). Por outro lado o batismo cristão era aplicado em ambos os sexos: a Lidia (Atos 16:15) ao varão da Etiópia (Atos 8:38). As condições para o batismo eram duas: a) entender claramente a mensagem; b) de coração aberto, aceitá-la. Fé em exercício e alegria inteligente eram os pré-requisitos deste rito cristão – totalmente nulos nos recém-nascidos.[28]  

Talvez essas evidências justificam o silêncio do Novo Testamento em relação ao batismo infantil, porque para o batismo é necessário fé e não é possível no recém-nascido a fides infantilis. Dessa questão vem o próximo ponto, na letra d. Prefiro chamar os sinais externos de sacramentos, isso devido ao fato de que a ordenança não é apenas uma norma rígida e fria ou como já ouvi: “apenas uma ordenança”, mas há um símbolo verdadeiro de nossa união com Cristo vivenciada pela fé, um relacionamento espiritual, ou seja, um sacramentum (mistério) de nossa comunhão com o Cristo vivo e verdadeiro. Há bênçãos dispensadas no batismo e na ceia.

d) Bíblia e Tradição. O pedobatismo descansa sobre a premissa de uma regeneração futura da criança, oferecendo o batismo como esperança futura (Calvino, Institutas, IV, Cap. XVI). Sendo assim, o pedobatismo é um batismo incompleto. O batismo do recém-nascido é aplicado em dois atos – batismo e pública profissão de fé. O Schleiermacher diz bem: “Batismo infantil só é batismo verdadeiro quando a profissão de fé que vem depois de subsequente instrução é considerada como sendo o ato que o consuma”.[29]Em praticamente todas as Igrejas Reformadas os dois atos (batismo e profissão de fé) são praticados. Vê-se que o candidato batizado na infância, quando alcança a idade de discernimento faz apenas a profissão de fé e assim é incluído na membresia da igreja local.[30]Essa pública profissão de fé confirma “que ele tem uma fé viva em Cristo” e “pode assumir seus deveres como membro da igreja”.[31]

Na Bíblia não há essa separação entre dois atos. É notório que os teólogos pedobatistas reconhecem a necessidade da fé para que o batismo seja legitimado, então criou-se uma tradição da pública profissão de fé diante de toda a congregação. Aqui há um elemento bíblico (batismo) e uma tradição (profissão de fé), assim com esses dois atos o crente é completamente batizado e comungado em Cristo.

Por outro lado, o credobatista precisa incluir através de um sinal externo, seus filhos. Segundo o Novo Testamento o batizando precisa ter fé e segundo o texto de 1Coríntios 7: 14 o recém-nascido já é considerado santo sem o batismo, mas repousando na fé dos pais crentes ou pelo menos de um pai crente. O credobatista precisa batizar e ao mesmo tempo apresentar com um sinal externo. Daí se convencionou também uma tradição. Essa tradição se chama apresentação e consagração dos recém-nascidos, onde os pais crentes levam seus filhos para que o Ministro os abençoe diante de toda a congregação. Os credobatistas apresentam e consagram seus filhos recém-nascidos e somente na idade de discernimento aplicam o batismo, que em si, pela natureza e significado é uma pública profissão de fé. Nessa posição também há elemento bíblico (batismo) e tradição (apresentação e consagração).

Diante do exposto, vê-se que há forte fundamento bíblico para as duas posições, mas há também a necessidade de criar uma tradição para reger na prática o sacramento e fazer com que as duas posições permaneçam de pé e coerente diante da teologia bíblica da aliança. As duas posições, sendo reformadas se mantém dentro dos limites da Escritura e saudavelmente honram a Deus incluindo seus filhos completamente por meio da Bíblia e da tradição, sustentando o batismo e a fé.
  
Conclusão:

Diante da polarização e das divisões causadas pelos extremos, a posição kalleyana é muito saudável e pertinente. Aprendemos a respeitar as práticas das outras denominações e estender a destra da comunhão tanto para batistas, como para presbiterianos e ao mesmo tempo manter nossa identidade e perfil denominacional sendo fiel à Palavra e à ordenança do Nosso Senhor Jesus Cristo.

Eu particularmente tomo emprestado e repito as palavras do Rev. Kalley e com muito respeito e admiração digo: “não sou presbiteriano e nem batista”. Com esse artigo busco honrar e trazer à tona as influências recebidas pela Igreja Cristã Evangélica sobre o batismo e reafirmar aquilo que com esmero e muita dignidade foi construído pelos irmãos cristãos evangélicos do passado e revelar uma argumentação bíblica e sólida para o assunto, tendo consciência das diferenças não essenciais dentro da própria denominação, o qual sempre tratarei com amor e respeito.

A Igreja Cristã Evangélica crê conforme sua Confissão de Fé, que é um resumo dos 28 artigos do Kalley, elaborado pelo Rev. Esli Pereira Faustino, em 1978 e ratificado no Concílio Constituinte de 1979, dizendo que “o batismo é realizado após a profissão de fé” e “em testemunho público de fé e como símbolo externo da obra regeneradora do Espírito Santo” (Art. 12º Da doutrina do batismo). Sendo assim e como exposto em todo o artigo, a ICEB defende o credobatismo e ao mesmo tempo ao longo de sua tradição recebe seus filhos na comunhão e alegria da igreja local e ainda investe recursos e esforços para que nossas crianças, através da Editora Cristã Evangélica, tenham pleno conhecimento do Nosso Senhor Jesus Cristo.

Ao Deus Triúno, que com graça e poder, guia e preserva Sua Igreja até o final, seja a honra e glória para todo o sempre, amém!


[1] UESA – União Evangélica Sul Americana, uma Missão com sede em Londres e progenitora da Igreja Cristã Evangélica do Brasil. Hoje a UESA traz o nome de Latin Link.
[2] Martins, Eliel de Almeida. Catecúmenos. São Paulo: Junta do Sul da Igreja Cristã Evangélica do Brasil, 1968, p. 49.
[3] Cardoso, Douglas Nassif. Praticas pastorais do pioneiro na evangelização do Brasil. São Bernardo do Campo, SP: Do autor, 2002, p. 46.
[4] Cavalcante, João. Uma nuvem pequena como a palma da mão. Anápolis, Go: Do autor, 2014, p. 78.
[5] https://www.youtube.com/watch?v=WyAxEZJBxbw - Acesso em 03 de outubro, 2018.
[6] Os batistas particulares eram os batistas reformados do século XVII, que passaram a batizar somente os crentes e que acreditavam na expiação limitada ou particular. Cristo morreu “particularmente” pelos eleitos, daí o termo Batista Particular.
[7] Hulse, Errol. Batismo e o que significa ser membro de uma igreja. Igreja Batista Bereana, 1978, p. 5.
[8] Apud, Anglada, Paulo. Para vós e para vossos filhos – O batismo cristão. Ananindeua, PA: Knox Publicações, 2014, p. 37.
[9] Cardoso, Douglas Nassif. Práticas pastorais do pioneiro da evangelização do Brasil. São Bernanrdo, SP: Edição do autor, 2002, p. 53.
[10] Explicação extraída da apostila de teologia bíblica. Elaborada pelo Rev. Guilherme Paim.
[11] Ibidem.
[12] Confissão de Westminster. São Paulo: Cultura Cristã, 2005. p. 69,70.
[13] Lopes, Augustus Nicodemus. O que você precisa saber sobre batalha espiritual. São Paulo: Cultura Cristã, 1998, p. 61.
[14] Cole, R. Alan. Comentário de Êxodo. São Paulo: Vida Nova, 1980, p. 150.
[15] Calvino, João. 1 Coríntios. São Bernardo do Campo, SP: Edições Parakletos, 2003, p. 218,219.
[16] Prior, David. A mensagem de 1 Coríntios a vida na igreja local. São Paulo: ABU, 2001, p. 133.
[17] Morris, Leon. I Coríntios – introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova, 1983, p. 27, 88.
[18] Martins, Eliel de Almeida. Catecúmenos. São Paulo: Junta do Sul da Igreja Cristã Evangélica do Brasil, 1968, p. 17.
[19] Forsyth, William B. Jornada no império. São José dos Campos, SP: Fiel, 2006, p. 225.
[20] Cardoso, Douglas Nassif. Práticas pastorais do pioneiro da evangelização do Brasil. São Bernanrdo, SP: Edição do autor, 2002, p. 53.
[21] Cardoso, Douglas Nassif. Praticas pastorais do pioneiro na evangelização do Brasil. São Bernardo do Campo, SP: Do autor, 2002, p. 50.
[22] Ibidem, p. 55.
[23] Martins, Eliel de Almeida. Catecúmenos. São Paulo: Junta do Sul da Igreja Cristã Evangélica do Brasil, 1968, p. 49.
[24] Clayton, Joyce E. Winifred Every. Um grão de mostarda. Recife, PE: Igreja Evangélica Pernambucana, 1998, p. 88.
[25] Watson apud Matthew Henry, in: Watson, T.E. Bebês devem ser batizados? São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 1999, p. 98.
[26] Ibidem.
[27] Clayton, Joyce E. Winifred Every. Um grão de mostarda. Recife, PE: Igreja Evangélica Pernambucana, 1998, p. 69.
[28] Cardoso, Douglas Nassif. Praticas pastorais do pioneiro na evangelização do Brasil. São Bernardo do Campo, SP: Do autor, 2002, p. 51.
[29] Barth apud Schleiermacher, in: Barth, Karl & Cullmann, Oscar. Batismo em diferentes visões. São Paulo: Fonte Editorial, 2004, p. 45.
[30] Manual Presbiteriano, capítulos V e VI, p. 126,127.
[31] Ross, Ivan G. Graham. Pública profissão de fé. São Paulo: CEP, 1989, p. 83-85.